(Trechos do discurso de 8 de outubro de 1949)
No momento atual, de tanta confusão, somos uma atitude nítida em prol da unidade do Brasil e da espiritualidade que deve ser inspiradora de nossas instituições.
Acreditamos na Democracia, estamos convencidos de que a sua prática é possível se esta não for confundida com anarquia e indisciplina. E o povo brasileiro vai compreendendo na coerência com que agimos, algo que transcende do cotidiano político oferecido pelos acontecimentos cujo sentido desagregador se acentua nas últimas semanas como fatalidade da insuficiência dos partidos.
SUCESSÃO PRESIDENCIAL E PARTIDOS NACIONAIS
O presidente do PRP entra depois na análise do que ele chama “o drama da sucessão presidencial”. Mostra como os partido se revelam incapazes de resolver tão magno problema.
“Os partidos não se entendem, não conseguem atingir uma conclusão qualquer” — diz Plínio salgado — “porque eles se apresentam sem unidade interna. Acreditou-se que os partidos nacionais pudessem ser fabricados no papel ou pudessem nascer espontaneamente de leis forjadas nos recessos dos gabinetes. Mas o essencial para a existência de um partido nacional, é a manifestação do espírito de unidade oriunda de pensamentos e sentimentos comuns. O partido nacional corresponde à atitude individual de cada membro, em consonância com a atitude coletiva que as próprias atitudes individuais produzem. Uma doutrina, uma consciência histórica, um sentimento, uma técnica, esses são elementos essenciais à vida de um partido nacional; mas para se conseguir tais fatores, cumpre exercer incessante apostolado e que o exemplo dos chefes seja mais importantes do que os seus discursos; então, o tempo completará a obra.
Mas o que vemos no Brasil são partidos que não conseguem, nem ao menos, a sua unidade interna. Estão divididos em alas; os interesses das facções que eles contêm gritam mais alto do que os objetivos da coletividade que se acolhe sob a legenda puramente convencional. Acima do nacionalismo, fala nesse partido o regionalismo de suas seções estaduais; e dentro destas, as pequenas correntes que se subdividem.
Apresentam-se, por exemplo, três partidos com o fim de realizar um acordo. Mas na realidade não são três partidos, porque cada um deles está dividido em subpartidos, ou grupos em torno de pessoas ou de interesses regionalistas. De sorte que certas alas de uns se ligam a certas alas de outros, enquanto as alas restantes tramam conchavos em particular. Quando as direções nacionais de tia partidos se reúnem, já existe em torno dela várias alianças e sub-alianças, a impedir qualquer pacto planejado pela direção nacional. Decorre daí a impossibilidade prática da solução do problema da sucessão presidencial, como temos visto no decurso de vários meses de agonia política. Como consequência, sobrevém a desilusão, o ceticismo, o desânimo”.
OS DESCRENTES DA DEMOCRACIA
“Fracassando a possibilidade do funcionamento dos partidos nacionais” — continua o presidente do PRP — “os seus chefes, os políticos em geral, manifestam-se desolados, mostram-se descrentes da Democracia. Os partidos não funcionam, por falta de coesão interior. Os interesses regionais dos Estados são mais fortes do que o interesse da Pátria comum, os grupos agem em detrimento da legenda partidária nacional. É então que surgem na densa neblina da confusão em que tateiam, os mais expressivos dos céticos do Regime, clamando pelo único remédio que, no seu entender, está fora das disposições constitucionais.”
OS GOLPISTAS
“Esses fazem a propaganda do golpe de Estado. São os desiludidos de toda ordem legal. São os inconformados com o funcionamento da Democracia e os temerosos dos efeitos que possam advir desse funcionamento.
Alguns pretendem que nem haja eleições, alegando que o país não está preparado para a pratica do sistema que adotou; outros admitem a realização do pleito eleitoral, mas subordinando-o a certas condicionais, isto é, permitem-se as eleições, contanto que Fulano ou Beltrano não sejam eleitos pois se tal acontecer, não se pode permitir que tomem posse”. [1]
“Mas, então, senhores” — pergunta o presidente do PRP — “em que país estamos? Sob que regime vivemos? Que constituição nos rege? Como que sinceridade e com que verdade foi discutida, redigida e promulgada a nossa Carta Constitucional? Até que ponto podemos crer na lealdade daqueles que, dizendo-se imunes dos extremismos da direta ou da esquerda, proclamam-se paladinos da Democracia? Acaso, em vez de uma Carta Constitucional, temos uma Carta Condicional?”. [2]
ANTICOMUNISTAS E ANTIGOLPISTAS
“Como veem os brasileiros, não somos nós, os acusados de inimigos da Democracia, aqueles que se manifestam descrentes no Regime.
Cremos na possibilidade da prática do sistema democrático representativo, desde que essa prática não contrarie o espírito dos partidos nacionais e da verdadeira reapresentação popular. Para que esse espírito não seja contrariado, cumpre que exista disciplina partidária. Se existe algum regime que necessite fundamentalmente de disciplina, é o regime democrático. A disciplina é a base da democracia, porque se não existe democracia sem o funcionamento dos partidos, os partidos não podem funcionar sem que os seus quadros se submetam à disciplina.
Só os regimes totalitários, as Ditaduras em geral, não precisam de disciplina, porque vivem pelo arbítrio de grupos que impõem sua vontade discricionária à maioria dos cidadãos.
A desordem é o clima dos governos de força, pois a força justifica-se unicamente como imposição de uma ordem precária. Mas a Democracia precisa de disciplina e esta é o resultado, não artificial, mas natural do estado de espírito criado por um pensamento doutrinário, uma consciência de realidades e um sentimento que irmana os homens da mesma agremiação.
Muitos há que confundem Democracia com indisciplina e até com anarquia. É desse erro que provém a descrença nas soluções democráticas.
Precisamos crer na Democracia e fortalecê-la com rigoroso espírito de Ordem. Sem Ordem não há hierarquia de valores nem respeito à autoridade, nem consciência, nem unidade partidária.
A desordem com o desencadeamento dos interesses privados, produz o clima propício à desenvoltura do comunismo, que representa, hoje, o mais grave, o mais tenebroso perigo nacional.
Não faltam aqueles que, sob a alegação dessa ameaça moral para nossa Pátria, e considerando a insuficiência dos partidos, justificam a necessidade da supressão de todas as normas legais e constitucionais. A nossa posição, entretanto, integralistas do Brasil, é clara, insofismável: somos anticomunistas, mas somos também antigolpistas. Pleiteamos soluções legais e entendemos que, dentro da Constituição e das leis, encontramos remédios contra a quinta-coluna moscovita, remédio que só não é aplicado, justamente pela incapacidade dos homens públicos em dar vida, eficiência e ação pratica às previsões e recursos dos textos vigentes.
EXTREMISMO DA ESQUERDA E DA DIRETA
Não sirva o comunismo ou a confusão política de pretexto para a implantação de qualquer forma de ditadura. Seria substituir o extremismo da esquerda pelo extremismo da direita. Dizendo isto, não transijo, um milímetro sequer, na linha anticomunista que o nosso partido traçou e que tem seguido invariavelmente. Sei que essa atitude nos tem custado muito caro. Entre as calúnias que nos atiram os cripto-bolchevistas e as linhas auxiliares do Cominform, através de certos jornais pelos quais se baba a burguesia progressista, figura aquela que diz ser o Partido de Representação Popular um elemento de provocação, chocando-se nas ruas com os adeptos de Moscou a fim de criar um clima propício a golpes de Estado e implantação de Ditaduras.
Nunca o nosso partido promoveu desordens; nunca foi se imiscuir nas reuniões e comícios dos comunistas quando em plena liberdade promovem suas manifestações em favor do petróleo para a Rússia ou da paz imposta ao mundo pelo César Vermelho que se prepara, ativamente, para a guerra. Quando, em recintos fechados, realizamos nossas sessões garantidas pela Constituição, pelas Leis Civis e especialmente pela Lei Eleitoral, são os comunistas que tentam perturbar-nos, uma vez que somos o partido que Stalin não tolera. Pois bem; esses jornais, infiltrados de bolchevistas repetem, sistematicamente, que constituímos o extremismo da direita, a provocar choque com o extremismo da esquerda.
Ora, os fatos dos últimos tempos demonstram o contrário. Em Porto Alegre, em Fernandópolis, em Santos, recentemente, os comunistas chocaram-se sangrentamente, não com o Partido de Representação Popular, mas com a polícia, quando esta, legitimamente, pretendia impedir conspirações, desordens, atentados e manifestações agressivas por parte dos agentes de Moscou. Por conseguinte, se aqueles jornalões entendem que o PRP deve ser fechado porque se opõe à horda russa, nessa caso, pelo mesmo motivo, deveria reclamar o fechamento da polícia.
Não quero com estas palavras fazer restrições ao heroísmo e ao sacrifício pela Pátria, demonstrado pelas dignas autoridades públicas e seus auxiliares na defesa do Regime e da tranquilidade das famílias; somos, também, anticomunistas e estamos dispostos sempre a prestigiar os representantes do Governo no seu esforço pela salvação do Brasil contra a ameaça do imperialismo russo. O que quero mostrar é a incongruência e a desonestidade dos nossos acusadores, que se fingindo farisaicamente os paladinos da Democracia, tudo fazem para anular e destruir as forças lidimamente nacionais que se erguem para sustentar a independência e a honra da nossa Pátria, ao mesmo tempo que favorecem os comunistas fingindo combater o comunismo.
O extremismo da direita, entretanto, não é constituído nem pelo Partido de Representação Popular, nem pelas autoridades públicas que agem no cumprimento do dever e em defesa da Democracia. O extremismo da direita é constituído pelos descrentes do Regime, pelos desiludidos da Constituição e das Leis, pelos que falam em golpes de Estado e sonham novamente, com o aspecto da Ditadura de que as Forças Armadas libertaram o povo brasileiro.
DENTRO DA ORDEM LEGAL
É dentro da ordem legal que o Partido de Representação Popular quer viver e trabalhar. É sustentando a Constituição. É agindo como o espírito democrático. É exercendo uma ação, ao mesmo tempo, político-eleitoral e cultural-educacional. Com estes propósitos, temos desfraldado a Bandeira em que inscrevemos o lema “Por Cristo e Pela Nação”. Com essa bandeira marcharemos. Em espírito de unidade nacional. E com os olhos postos no futuro, pela felicidade do nosso povo e pela grandeza da Pátria Brasileira.
(Fim do discurso)
Notas da Edição Original:
[1] Chamamos a atenção do leitor: este discurso é de 1949…
[2] Estas interrogações de 1949, que influíram favoravelmente quanto à posse de Vargas em 1951, sendo ele o maior adversário do Integralismo, harmonizaram-se com a atitude do PRP em 1955.