Por meses de 2020, a Folha de S. Paulo, Época, O Globo, Ponte, Tribuna da Imprensa Livre, NSC Total e mais alguns órgãos da imprensa sem-vergonha comentaram um dos mais novos livros publicados sobre o movimento integralista: “O Fascismo em Camisas Verdes: do Integralismo ao Neointegralismo”, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto.

O autor Leandro, à Ponte, chega a se espantar com a nossa “dinâmica na internet”. Diz não saber de onde vem o “investimento e financiamento” que sustenta nosso site, sede, ensino à distância e iniciativas individuais. Para ele, o maior vício perante o Integralismo tem sido o de subestimá-lo, ignorando sua presença forte, solidez, organização, princípios filosóficos e atualização.

Obrigado! Lisonjeados como ficamos, até quisemos ver qual não deveria ser a capacidade do livro de mentir sobre nós. Compramos o livro, caríssimo para o seu valor real. Uma rápida pesquisa comercial constatou que um pacote de rolos com quantidade maior de papéis de função análoga (este só tem 208 páginas) sairia mais barato. Para essa nossa aquisição, contribuíram, certamente, os ricaços da “base financeira” oculta e sombria que, segundo Leandro, tem mantido a nossa retaguarda. Ao cabo de algumas sessões de penitência e mortificação, conseguimos terminá-lo, contra todas as previsões psiquiátricas.

Um livro muito espertinho

Foi algo cômico assistir à live de lançamento de O Fascismo em Camisas Verdes: do Integralismo ao Neointegralismo. O sorrisinho entre os autores como que sussurrava de um para o outro: “Eu sei, isso é mentira, mas é engraçado, é sim”. Talvez por isso, nem se deram ao trabalho de incluir referências bibliográficas (nem que fosse um breve apanhado!) no livro inteiro.

O prefácio é uma coisa terrível. A primeira coisa que o eminente prefaciante se atreve a falar de Integralismo é que acha incoerente nós elogiarmos a autoridade e nos valermos da política partidária. Que sinceridade louca! E está certo: É estranho conciliar a anarquia da política partidária contemporânea com o princípio de autoridade! Por isso, nos imiscuir na luta de partidos é um mal, mas mal necessário, para evitar que os abutres corroam o que ainda restou do Brasil…

Mostraremos, neste artigo, que O Fascismo em Camisas Verdes, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, é um livro sem seriedade nem caráter histórico

Profissão: historiador… e médium

Algum dos dois “historiadores” teve a brilhante ideia de dizer que Plínio Salgado “acreditou” com veemência que era a versão nacional de Mussolini. Aqui, toda a terra estremece.

Um “historiador” que é médium! Todos os absurdos parece que se justificam com a fonte revelada de suas informações: os espíritos. Lidamos aqui com umas crenças pessoais de Plínio Salgado, que “acreditou” e, até onde se sabe, não falou com ninguém…

Plínio também “se autodenominava gênio”, dizem. Só nos vem à mente o livro “Psicologia da Revolução”, quando Plínio analisava o “Gênio Político”, uma categoria geral que usa para estudar as personalidades de grande talento prático… nossos “historiadores”, além de picaretas e médiuns, também são péssimos intérpretes de texto — e fogem de dizer as fontes das suas informações como foge o Diabo da Cruz.

Os poderes mediúnicos vão além. Chegam a dizer que, para Plínio, era “um grande erro pensar que alguém o influenciou”. Gostava de dizer que tinha um pensamento “próprio, original e sem relação com qualquer outro político ou escritor“. “Gostava de dizer”, porque disse, uma vez, algo assim, privadamente, a Hélgio Trindade…

E o que disse? Disse que “tira conclusões das realidades observadas”, ainda que com base em uma bagagem intelectual, porque “de alguma forma isso é condicionado pelo espírito da época. O homem não vive trancado dentro de um quarto. O homem vive num mundo”. Isso se coaduna, de alguma forma, com a passagem dos autores?

Na mesma conversa com Hélgio Trindade, Plínio disse que os “mestres do Integralismo” são Alberto Torres, Farias Brito, Euclides da Cunha, Olavo Bilac, Jackson de Figueiredo, Eduardo Prado e Monteiro Lobato. E, em 10 de outubro de 1972, na Câmara dos Deputados, um ano depois da entrevista a Hélgio Trindade, disse, quando listava novamente todas as suas influências: “Vejam, não quero ser original“.

Mas que influências foram essas, mesmo? Lamentamos, senhores: não foram os fascistas, como Gentile, Rocco ou Panunzio (pedimos desculpas se não souberem quem são os teóricos do fascismo). São autores brasileiros, cristãos e democráticos.

De que isso importa, não é? Para defender a tese contrária, algum dos espertões transcreve o seguinte: “Um dos mais destacados militantes, Roland Corbisier, não tinha dúvidas: ‘Claro que era fascismo!'”. Eles leram a afirmação do “destacado militante” em uma entrevista anônima do livro de Hélgio Trindade. E, por ser anônima, não quiseram nem ir atrás do nome do entrevistado. Era Américo Jacobina Lacombe, um liberal, e não Corbisier.

Mas Corbisier, meus caros e estimadíssimos picaretas, era comunista…

Os abutres e o cachorro morto

Das acusações ridículas sobre a AIB ser financiada pelo regime fascista na Itália, os nossos dois honestíssimos escritores pegaram a pior.

Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto “deixam no ar” que o Conde Galeazzo Ciano, Ministro das Relações Exteriores de Mussolini, enviava um mínimo de 40 contos de réis mensais a Plínio Salgado. Será possível que nisso não tenham se dado nem mesmo ao trabalho de checar o mais importante livro de Plínio Salgado sobre sua história, cujo tema principal versariam capítulos depois, qual seja o Livro verde da minha campanha, de 1956?

Bastaria o argumento de Plínio Salgado: “Se Ciano mandasse dinheiro para os integralistas, haveria de referir-se a liras e não a contos de réis; além disso, que significava para o Integralismo, que gastava só com os déficits de seus oito jornais diários a quantia de 120 contos mensais, a irrisória quantia de 40 contos? Valia a pena comprometer o movimento, que arrecadava de suas centenas de milhares de associados em todo o país e dos simpatizantes como os Rocha Miranda, os Guinle, Carlos Lira, Henrique Lage, Pedro Morganti, Fileno Miranda, Raul Leite, Inacio Nogueira, Gonçalo de Melo, e tantos outros, mensalidades mais vultuosas, montando tudo em mais de 300 contos mensais, valia a pena receber 40 contos de Ciano, quantia irrisória para o vulto do Integralismo no país?”.

Depois de uma análise dos diários do Conde Ciano, Plínio conclui, finalmente, que não recebeu nada da Itália. Com efeito, o Conde Ciano começou a escrever seu diário dois anos depois de ter, supostamente, anotado ali seu financiamento ao Integralismo…

Um dos piores livros já lançados sobre o Integralismo: O Fascismo em Camisas Verdes, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto

Manifesto de Outubro…

Vimos que o Integralismo, segundo nossos espertões, é uma doutrina fascista por A + B. De que se constitui ela? Ora, está tudo no Manifesto de 7 de Outubro de 1932, não é?

Segundo nossos “historiadores”, o Manifesto foi redigido “após calorosos debates nas reuniões da SEP”. Bom, não é o que consta na história, segundo a qual tudo ocorreu em perfeita harmonia e com algumas poucas adições, mas deixemos para lá…

O conteúdo do Manifesto, segundo eles, é esse: “os integralistas faziam elogios à autoridade, críticas aos partidos políticos e defendiam o princípio da autoridade”. Caramba! Quanta autoridade, autoridade e autoridade! Defendiam, também, os integralistas, um programa social que se enquadrasse num “Estado de tipo fascista, o Estado Integral”. Aqui, são os nossos autores dizendo, já que o Manifesto não fala nada mesmo de fascismo.

Na verdade, o Manifesto que nós conhecemos é o primeiro publicado no Brasil que condena o Estado Totalitário, quando diz: “O Homem não pode transformar-se em uma abelha ou num térmita. O Homem e sua família precederam o Estado”. O Manifesto que nós conhecemos rejeita qualquer ideologia estrangeira, quando diz: “Queremos criar um direito público nosso, de acordo com as nossas realidades e aspirações”. O Manifesto que nós conhecemos rejeita o cesarismo e o messianismo pessoal, típicos do fascismo, quando diz: “Civis e militares giram em torno de pessoas, por falta de nitidez de programas”. Se defender a ordem, a autoridade, a democracia em que o povo tenha representação real, o amor pelo próprio povo, a unidade nacional e o valor das coisas espirituais fosse fascismo, todos os homens de bem seriam fascistas… É uma bela artimanha para rotular todas as coisas boas.

O Manifesto, segundo os rigorosos autores, traz esses três princípios: Deus, Pátria e Família. Família é o “início e fim de tudo”. Nossos autores escreveram um livro inteiro (com 208 páginas!) sobre o Integralismo e, por aqui mesmo, demonstram seu profundíssimo conhecimento sobre a Doutrina tratada! Para explicar o Manifesto, copiaram e colaram as Perguntas e Respostas da FIB… sobre o Integralismo, não sobre o Manifesto…

E a burrice se espalhou. Em artigo sobre o livro, o Terra afirma que “no Manifesto de Outubro (1932), o fundador do integralismo explicou o significado do lema: Deus é ‘quem dirige o destino dos povos’, pátria é o ‘nosso lar’ e família, ‘o início e o fim de tudo’”. O Manifesto não diz nada disso: quem disse fomos nós no século XXI! A imprensa, dando-se ao trabalho de ler as 208 páginas do livro, não quis ir às 4 ou 5 páginas do Manifesto de Outubro, tratando com leviandade inacreditável (exatamente como os autores) o documento mais básico, importante e acessível de todo o assunto tratado

Apesar disso, o elevadíssimo conhecimento (quase uma Gnose) dos dois autores sobre o Manifesto de Outubro se estende até mesmo às entrelinhas. Segundo os eruditos autores, a expressão “Deus dirige o destino dos povos” traduz o caráter messiânico estabelecido em torno de Plínio Salgado, “visto como um profeta”…

É mesmo?! Que apreensão! Pobre do salmista, no Salmo 66, ou de Santo Agostinho, na Cidade de Deus! Estavam querendo dizer, quando falavam que Deus cuida do destino das nações, que Plínio Salgado é um profeta. Não é possível que essa dedução sobre a expressão mais icônica de toda a doutrina integralista seja acadêmica, seja resultado de estudos sérios.

Quão distante, afinal, esse tal “caráter messiânico” está das palavras de Plínio Salgado aos formandos de Jaboticabal, em 1934, recusando-se a ser cultuado em sua cerimônia de graduação: “O mal do Brasil é o caudilhismo e o messianismo. O mal do Brasil é a personalização de todos os movimentos. (…) O mal do Brasil é o endeusamento dos homens e a falência das ideias. O mal do Brasil são as homenagens repetidas e ridículas a pessoas”. São palavras do Chefe, não palavras vazias para inglês ver, mas diretiva interna, aos próprios integralistas, interrompendo no berço a progressão de um messianismo sobre sua figura… Em nosso site, temos uma seção inteira de citações sobre o tema Culto ao líder.

É que Plínio Salgado não traduziu também o que queria dizer “Deus dirige os destinos dos povos”. Esse trabalho ficou para os nossos historiadores. Uma pena que o livro não saiu antes de 1975! Poderiam ter alertado ao autor original.

Se os geniais autores lessem o Manifesto de Outubro, cujos assuntos entenderam tão bem (em suma: autoridade, autoridade, crítica aos partidos e defesa do fascismo), que é o Manifesto que se inicia com o Deus dirige os destinos dos Povos, teriam lido também a passagem no capítulo VI, que já citamos, sobre o problema de girar a política em torno das pessoas por falência de programas…

Quando comparam o “Chefe” às categorias alemãs e italianas de “Duce” ou “Führer”, os autores passam por cima de toda a história. Esquecem, por exemplo, que era Plínio Salgado a dizer, no mesmo discurso de 1934: “É justamente porque o nosso movimento difere do italiano e do alemão que devemos libertar-nos, definitivamente, da adoração dos homens, que é ainda um remanescente de uma época morta. A Humanidade Nova abandonará os últimos prejuízos das idolatrias”. Daí que, em 14 de fevereiro de 1936, à “Offensiva” (em Nacional-Socialismo e Nacionalismo Cristão), dissesse, ainda, que a ideia nazista de “Führer” exprimia “um artificialismo político, que foge de toda a base de equilíbrio da razão humana”.

Desonestidade? Não parece ser. São burros. E é só.

E, se for verdade que “Plínio Salgado era categórico e dizia que acabar com a simbologia representaria o fim do Integralismo”, resta aos autores explicar por que, em 18 de agosto de 1937, Plínio Salgado baixou um decreto proibindo o uso dos símbolos integralistas em todo o Brasil. Decreto que vigorou por quase dois meses, até 6 de outubro de 1937…

Segundo os nossos historiadores, Plínio estava “categoricamente” acabando com o Integralismo…

Mais: se a população brasileira era “vista por ele (Plínio) como ignorante e sem condição alguma de compreender a doutrina”, não se explica por que escreveu livros acessíveis, exclusivamente para o populacho: o primeiro deles, “O que é o Integralismo”. Nem por que os Protocolos e Rituais da Ação Integralista Brasileira tornavam obrigatório a todos os núcleos do Brasil que tivessem uma cópia física para leitura e ensinassem a todos os membros o Manifesto de Outubro de 1932, as Diretrizes Integralistas e o Manifesto-Programa de 1936. E, muito menos, que os seus Estatutos se refiram à Ação como um centro de estudos, visando divulgar “princípios filosóficos, doutrinas econômicas, sociais e políticas, diretrizes estéticas, pesquisas científicas e técnicas” para “elevar o nível cultural de seus componentes“.

Não se justifica, enfim, que a Ação Integralista Brasileira fosse, principalmente e antes de tudo o mais, um centro de estudos e doutrinação das massas.

Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, em O Fascismo em Camisas Verdes, prestam um desserviço à academia e à história no Brasil

Palpites, palpites, palpites

São erros bobos, que nossos “historiadores”, academicamente rigorosíssimos, não se cansam de cometer. Chegam a mencionar uma “noção particular de vida post mortem” do Integralismo, onde ninguém morria, mas, ao ser martirizado, era “transferido para a milícia do além para ser comandado por Deus”…

Mas a milícia do além que nós conhecemos é aquela descrita nos Protocolos: “No Integralismo ninguém morre. Quem entra para o nosso Movimento, imortaliza-se no coração de todos os Camisas-Verdes”. Nenhuma “noção particular” aqui, nem qualquer coisa sobre o comando divino da Milícia…

Algum dos dois espertões afirma, depois, que “o catolicismo foi o principal braço religioso dos integralistas”. Braço religioso? O Integralismo é o corpo, e a Igreja Católica o braço de que ele se serve? Os padres celebravam a Missa sob as ordens do movimento integralista? Plínio Salgado era tão profeta, e tão messias, que era um verdadeiro Papa, mas um Papa com outras religiões, uma vez que deviam haver outros “braços”? Que percepção das coisas…

Logo em seguida, os autores nos dizem que Dom João Becker, arcebispo de Porto Alegre, era um militante, um “batina-verde” (e um dos cinco únicos que conhecem). Na verdade, só esqueceram de uma breve ressalva, mas nada demais: que o arcebispo Dom João Becker, além de líder de um movimento anti-integralista, a Ação Social Brasileira, escreveu toda a sua 26ª Carta Pastoral, no começo de 1936, para se declarar contra o Integralismo. Aliás, em entrevista muito famosa, de 2 de agosto de 1937, ele listou os três maiores inimigos do Brasil: o comunismo, o Presidente Vargas e… o Integralismo…

Novamente os médiuns!

Os autores chegam a dizer, sem referência mesmo, ao vento, que a presença de militantes negros na Ação Integralista era permitida apenas em “caráter político eleitoral”. Mas sob qual fundamento? Havia, entre os integralistas, alguma postura escondida de discriminação racial? Haveria alguma carta de Plínio Salgado dizendo que negros eram menos brasileiros? Por que os autores dizem isso?

Em toda a nossa trajetória com picaretas anti-integralistas, poucas vezes vimos uma acusação tão infundada, absurda e sem-vergonha como esta. É de uma safadeza sem fim. Como os autores não se dão ao trabalho de prová-la, nós também não iremos a fundo (mostrando o que pensavam os líderes integralistas sobre os negros muito antes da AIB), já que o ônus da prova recai sempre sobre o acusador.

Na verdade, o mais ridículo não é tanto a acusação, mas o que a acompanha: “Com um caráter político eleitoral, o Integralismo possuía uma visão idealizada e paternalista do indígena, por isso permitiu a presença de militantes negros”. E o que têm os pobres indígenas a ver com os militantes negros do Integralismo? Como a presença dos negros se motiva a partir da idealização dos índios?…

Há livros honestos e desonestos, corretos e incorretos, sobre o Integralismo. Mas, em décadas, não conhecemos nenhum tão mal escrito. É tão mal escrito que é, em muitas de suas partes, francamente ininteligível. Eis O Fascismo em Camisas Verdes, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto.

O erro não é só de português, mas também de matemática. Afirmam, por exemplo, que Gustavo Barroso escreveu cerca de 70 livros. São apenas 58 casas a menos do número real!… Os autores fazem questão de mostrar, o livro inteiro, que não tiveram rigor nenhum com a escrita.

Aí, vem a contradição. Dizem, primeiro, que Miguel Reale tinha a responsabilidade pela doutrina do movimento e pela organização da juventude integralista. É difícil acreditar que escritores tão acadêmicos, tão ligados às universidades, tenham deixado passar a revisão para coisas tão grotescas. Há poucas páginas lemos sobre Plínio Salgado: “Com a função de orientar, doutrinar e executar, possuía a direção total e indivisível do movimento, tornando o seu poder centralizado, total e permanente“. Mas então como assim Reale tinha essas atribuições? A direção total não é também indivisível, e até na parte de doutrinar?

De resto, lamentamos aos autores, mas Reale jamais foi responsável pela juventude integralista, cujos trabalhos se reservavam à Secretaria Nacional de Arregimentação Feminina e de Plinianos (a cargo de Irene de Freitas Henriques). Ele cuidava apenas da pasta de Doutrina…

O Fascismo em Camisas Verdes, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto: um livro escrito por desonestos para difamar pessoas honestas

Vamos supor burrice

Falando de Plínio Salgado e Gustavo Barroso, os autores citam a “rivalidade entre os dois [que] era pública e notória”. Para provar, mencionam que “a imprensa chegou a noticiar em vários jornais” (na verdade, foi em apenas um jornal: o Diário da Noite, no Rio de Janeiro) “uma possível condenação a fuzilamento de Gustavo Barroso pelo chefe nacional”… um exemplo tão infame e ridículo que não chegamos a acreditar que o fizessem a sério. Dizem, aliás, que o fato “foi desmentido por Plínio Salgado”.

Mas não só por Plínio Salgado: foi desmentido, também, por Gustavo Barroso, subscrevendo (na “Offensiva”, de 15 de abril de 1936) que, não só a “notícia tão ridícula e desprezível que, não chegou, nem mesmo, a ser infame”, mas “tudo o que se disser em contrário” ao fato de que o Integralismo “constitui uma só força, sem coloridos de facções internas, força unida e coesa, obedecendo a uma só voz: a do Chefe Supremo do Movimento” não passa de “invencionice e mórbidas fantasias de assalariados dos inimigos da Pátria”.

No ano seguinte, em 12 de abril, após várias alegações midiáticas de cisão de Gustavo Barroso todos os meses, desmentidas sem parar, o Correio da Noite do Rio de Janeiro pediu uma entrevista do próprio Gustavo Barroso. “Não preciso dar entrevista. Tudo é boato. Querem conseguir desmembrar o Integralismo, mas isso não conseguem”.

E, quanto ao “auge do Integralismo”, foi bem durante ele (que se deu nos meados de 1937) que Gustavo Barroso, em Integralismo e Catolicismo, disse: “O Integralismo exige um juramento de fidelidade e obediência à sua Doutrina encarnada no Chefe Nacional”.

Foi durante esse auge que ele escreveu Reflexões de um Bode, em que afirma, taxativamente, após refutar as acusações de que seus escritos contrariassem as ideias de Plínio Salgado: “Estou dentro da Doutrina e da Palavra do Chefe Nacional. Et nunc, et semper!”. Foi nesse mesmo livro que clamou pelos “que interpretam com segurança e defendem com ardor o pensamento puro da Ação Integralista, dentro do culto de obediência ao Chefe Nacional”.

Foi nesse auge, em 11 de junho de 1937, nas Cortes do Sigma, que exclamou que, diferentemente dos outros movimentos nacionalistas ao redor do mundo, em que há precursores e realizadores, o único chefe do Integralismo é Plínio Salgado: “Plínio Salgado é o primeiro e o único”.

Foi também nesse auge que, no Breviário do Camisa-Verde, escreveu algo forte como isso: “Teu Chefe, o Chefe Nacional, é o primeiro Camisa-Verde, o mais antigo veterano Integralista; foi Integralista antes de haver Integralistas e antes de haver Integralismo. Nele vive humanamente a Doutrina que Deus lhe inspirou para a salvação de tua Pátria.”

E foi, até depois desse auge, que, quando falava de Gustavo Barroso, em carta privada a Raimundo Padilha de 20 de agosto de 1940, Plínio Salgado destacava uma de suas principais qualidades: disciplinado.

Desonestidade? Não pode ser!

Mais para a frente, os autores dizem que Plínio confidenciou em 1946 ao genro, Loureiro, que os integralistas, “certamente”, “nunca passaram de 200 mil filiados”. A burrice é tamanha que dispensaria explicações. Todas as palavras são colocadas maliciosamente. Na correspondência a Loureiro, Plínio afirmou: “não é vergonha nenhuma sermos duzentos mil e sabendo que não passamos disso, não incorreremos em erros perniciosos”. Mas “sermos duzentos mil” em 1946 significa um número de 1946, não de 1937. E, se após 8 anos de difamações pelo Estado, pela imprensa, pelas escolas e pelos livros, ainda restaram 200 mil, isso significa, exatamente, que havia muito mais de 200 mil em 1937. Onde está a afirmação de que “nunca passaram”?

Porque ainda não queremos acusá-los de desonestidade (embora já nos tenham acusado de tanta coisa absurda…), pressupomos burrice.

Vamos supor burrice, também, quando os autores dizem: “Plínio Salgado dizia que o trabalho feminino fora do lar […] [era responsável] pela destruição da família”. Porque, se a mulher, sem dúvida, foi feita para o lar, o único livro que Plínio Salgado escreveu sobre o tema (A mulher no século XX) põe a questão em termos muito diferentes: “É lícito, e até um dever, em certas circunstâncias, que a mulher trabalhe fora do lar para auferir com virtude os meios de subsistência”.

Mas queremos acreditar que os autores pesquisaram tudo o que puderam sobre o Integralismo, escrevendo um longo livro sobre o tema e ganhando renome nacional por isso, mas, para falar do pensamento de Plínio Salgado, não tiveram como se dar ao trabalho de ler os livros de Plínio Salgado.

E suporemos burrice, até, quando dizem que o Vovô Índio no Natal era uma parte essencial da simbologia integralista. Porque, como dizia Gustavo Barroso (Integralismo e Catolicismo): “Refugando o Papai Noel barbudo do inverno europeu, [os esnobes indianistas] esquecem o Menino Jesus da nossa meninice brasileira que nos depunha os presentes desejados nas chinelas postas sobre o beiral do telhado ou no peitoril da janela, para se agarrarem à tolice dum Vovô Índio”. E, ao final da exposição sobre as tolices indianistas, conclui: “esta é a maneira integralista de resolver a questão”. No caso do Natal, rejeitar o Vovô Índio e propugnar o Menino Jesus.

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O Fascismo em Camisas Verdes desconhece todos os assuntos que busca tratar

O Estado Novo

Os autores falam da “presença dos integralistas no processo de organização para a implantação do Estado Novo”.

Mas que presença era essa?

Configura “presença na organização” que Plínio Salgado tenha recebido o projeto da nova Constituição e dito que não a apoiaria? Configura “presença na organização” que o Plano Cohen tenha sido furtado do Serviço Secreto integralista e usado com propósito distinto do original? Configura “presença na organização” que os integralistas não tivessem força para se opor às Forças Armadas e ao Governo? Configura “presença na organização”, enfim, que o Estado Novo tenha sido organizado para fechar o Integralismo, como confessam Negrão de Lima, um dos seus principais articuladores, citando Francisco Campos, e Pimentel Brandão, o ministro de Relações Exteriores de Getúlio durante o Golpe, segundo já mostramos em nosso artigo 1937: Os Estados Unidos fecharam o Integralismo no Brasil?

Os autores citam a Marcha dos 50 Mil, em 1º de novembro de 1937, como uma “manifestação de apoio ao governo”. Como têm coragem?! É exatamente o contrário! Olbiano de Mello, um dos fundadores da AIB e membro da Câmara dos 40, que depois largou o integralismo, e cujo depoimento portanto é insuspeito, relatou, em A marcha da revolução social no Brasil (Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1957, p. 114), o momento em que Plínio Salgado lhe contou sobre a marcha, poucos meses antes do Estado Novo:

“Poderemos dar uma demonstração de força antes do golpe. Resolvi desfilar aqui no Rio, no dia 1º de novembro próximo, 50.000 camisas-verdes. Se isto não retardar a mudança do regime, pelo menos servirá para que nos respeitem e nos deem oportunidade para evitar a aplicação total no Brasil deste monstrengo feito por Francisco Campos [a Constituição de 1937]”.

E Olbiano de Mello acrescenta que discordou de Plínio, sugerindo a data da Marcha para o própria dia do golpe, como forma de contragolpe… Quanto apoio! A marcha (anunciada ao público como comemoração do centenário de Couto de Magalhães) tanto foi uma “manifestação de apoio” que, durante ela (como sabe muito bem qualquer pesquisador), uma ala radical, incluindo o próprio Gustavo Barroso, queria tomar o poder das mãos de Vargas!…

Estudiosos sem estudo

É interessante: parece que toda a seção sobre o Estado Novo de 10 de novembro de 1937 adiante foi feita no “chute”. Escreveram algo e torceram para estar certo. Por não ver necessidade, não vamos comentar toda a bobajada confusa sobre Plínio Salgado e suas negociações com o Estado Novo, sobre a qual temos abundantíssimo material e documentação.

Uma hora, os autores separam os integralistas em duas correntes. Uma, pleiteando cargos — “o Ministério da Educação, por exemplo“. Mas, se é só um exemplo, quais são os outros cargos, além do exemplo? (Bom, nenhum…) A outra, conspirando pelas armas.

Só que, segundo os autores, a conspiração armada envolvia Plínio Salgado — que, evidentemente, participava da primeira corrente… Então como há duas correntes, se as mesmas pessoas participam de uma e de outra, com os mesmos objetivos — os líderes de uma estão dentro da outra, e vice-versa? Que belíssimo trabalho de sistematização histórica. Os autores demoraram oito períodos de faculdade, e mais alguns no mestrado e doutorado, para aprender a fazê-lo.

Mas, de certa forma, os autores estão certos. Plínio Salgado também conspirava. É claro. E ele começou a conspirar em fevereiro de 1938, segundo depoimento de Miguel Reale, que Plínio subscreveu. Ele e tantos líderes civis e militares da oposição. Mas a sua conspiração não era a mesma que eclodiu nas mãos de Belmiro Valverde, como eles dizem. Isso preferiram não comentar, como se fosse detalhe secundário…

Os autores dizem que Plínio Salgado “negou sua participação até a morte” no Levante de 11 de Maio. É, mas não só ele. Belmiro Valverde negou até a morte a participação de Plínio Salgado em seu levante… embora, desde 1938, não quisesse mais vê-lo nem pintado de ouro. A unanimidade dos participantes do Levante também negou, conforme manifesto conjunto publicado em O Livro Verde da Minha Campanha. O principal aliado de Valverde em seu levante, Raimundo Barbosa Lima, também negou, em cartas e pronunciamentos. E o General Castro Júnior, um liberal, que assumiria o Governo transitório em caso de vitória da “conspiração”, também negou: segundo ele, Plínio Salgado enviou um emissário para impedir a deflagração do Levante de Valverde.

O Levante de 11 de Maio não foi “conspirado” por Plínio Salgado. Dentro da trama de 1938, é um ato isolado, de lobos solitários. Os “pesquisadores” não pesquisaram isso e tentaram o chute.

No processo, vão confundindo tudo. Parecem não ter se dado ao penosíssimo trabalho de ler a biografia de Plínio Salgado, escrita por sua filha, Maria Amélia Salgado, com base na autobiografia que o próprio pai já vinha escrevendo. Fonte primaríssima. Segundo relata Maria Amélia, foi ela quem tentava “colocar fogo em alguns papéis”, quando a polícia invadiu a casa de Plínio Salgado em 1939: os autores, por alguma razão, escrevem que era Loureiro. Se nem a esta fonte recorreram, escreveram um livro inteiro com base em quê? Os autores não contam. Está tudo segredado nos arquivos obscuros de sua mente, que não permite bibliografia…

Mas essa bibliografia não teve espaço para fontes primárias. Só se for de anti-integralistas.

O Fascismo em Camisas Verdes, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, é um livro difamatório e panfletário

De 1938 em diante

Contra todos os depoimentos e documentos sobre 1938, os autores, sem apresentar provas, acusam Plínio Salgado de um autoexílio em Portugal. Depois de terem falado por tantos parágrafos sobre a terrível iniquidade do Chefe, que o levou a ser perseguido tão duramente pelo Governo, os autores, após se rirem tanto de que Vargas o detestasse, empurram, agora, a seguinte ideia: Plínio conseguiu um conluio com Getúlio e se foi para Portugal. O que explica?

Um trecho considerável do livro é dedicado a acusar Plínio Salgado de pedir ajuda ao Eixo, cooperar com a Alemanha nazista e ter contato com agentes alemães. Conhecemos bem a acusação, porque foi levada até a tribunal nos anos 80, desde quando já mais ninguém ousava insistir nisso…

Surge um problema grave: no período em que Plínio Salgado estaria fazendo tramóias e conjuras com os alemães para golpear o Ocidente, em Lisboa, Plínio (tal como facilmente se descobre nos registros documentais do Fundo Plínio Salgado em Rio Claro) estava internado, com tuberculose, os dois pulmões comprometidos e sem mal ter permissão de ler…

Nessas condições, lá foi Plínio Salgado conspirar! Este deveria ser um ato honroso em sua biografia: o que nenhum homem conseguiria fazer em condições semelhantes, Plínio Salgado fez… E até “entre vinhos e cervejas”… E, ainda, por cima estando longe de Lisboa, local dos encontros — e sem permissão de sair! Foi uma bilocação digna de um Santo Antônio…

Aliás: os autores cometem um trabalho francamente criminoso (porque irresponsável é todo o seu livro), quando falam da suposta “aproximação” de Plínio Salgado com Eric Schröder, um agente nazista. Citemo-lo, para mostrar toda a sem-vergonhice: “No fim do ano de 1941, dois jornalistas alemães, conhecidos por Bragard e Baron, apresentaram Eric Schröder a Plínio Salgado e Hermes Lins e Albuquerque. Havia um grande interesse em uma relação com Hitler. Falando ao confidente e amigo Ribeiro Couto, Plínio afirmou que a aproximação [a Eric Schröder] era ‘o começo de uma salvação universal'”.

Mas a carta a Ribeiro Couto, falando de seu anseio patriótico pela salvação do Brasil, é de 8 de fevereiro de 1941. Se a aproximação a Schröder veio em fins de 1941, como Plínio Salgado aludiu a ela no começo de fevereiro? Os autores podem ficar tranquilos, porque nós explicamos. Na verdade, é que os autores fazem uma manipulação completa, criminosa e absurda da carta. Peço ao leitor que leia as palavras do próprio coautor de O Fascismo em Camisas Verdes, Leandro Pereira Gonçalves, mas agora em outro de seus péssimos livros, Plínio Salgado: um católico integralista entre Portugal e o Brasil: “O interesse do líder integralista era muito grande numa relação com Hitler, sendo que, pouco antes deste momento [9 meses antes?], disse numa carta ao amigo Ribeiro Couto que a sua intenção era ‘acudir, salvar o Brasil: eis tudo! É o começo de uma salvação universal’. Dessa forma, enxergou no nazismo uma solução capaz de alcançar o poder no Brasil”. O que a carta a Ribeiro Couto tem a ver diretamente com alguma aproximação ao nazismo? Nada, como admitia Leandro em 2018. Na carta, Plínio só diz que queria salvar o Brasil. Segundo Leandro, esse desejo fervente de salvar o Brasil motivava uma aliança com a Alemanha. É só isso. Assim, por que o mesmo autor, que escreveu em 2018 que a carta era de “pouco antes deste momento”, em 2020 diz outra coisa, totalmente diferente? Pedimos ao leitor que volte e releia as duas passagens citadas, ambas do mesmo autor. É só para denegrir Plínio Salgado?

Vamos mais além. Os autores dizem que, em fins de 1941, “Vargas demonstrava a entrada ao lado dos Aliados — após acordos com os Estados Unidos”. Então, em seus mestrados e doutorados, não apenas não aprenderam nada decente sobre Integralismo, mas também não aprenderam sobre o Brasil na Segunda Guerra Mundial. Na última semana de outubro de 1941, o General Lehman W. Miller, chefe da equipe americana que conduziu as negociações comerciais dos EUA com o Brasil naquele mesmo mês, comentou que o Exército Brasileiro era visto como pró-Alemanha e não era confiável para os EUA. Summer Welles, subsecretário de Estado dos EUA, escreveu em janeiro de 1942 que o Brasil não estava inclinado a mostrar o menor entusiasmo pela guerra. No Brasil, segundo mostra John W. F. Dulles, de tão modestos os acordos de 1941, sua recepção foi indiferente: os brasileiros pró-Aliados os viram com ceticismo e decepção. Aliás, ainda durante as negociações, o Brasil recordava à equipe de negociadores do Estado-Maior americano que os alemães estavam dispostos a vender armas para o Brasil em condições melhores do que os Estados Unidos. Em julho, Vargas já havia sido evasivo à proposta de Roosevelt para entrar na guerra.

Nada, além da fabricação de uma narrativa, permitiria aos autores dizer que Vargas, em perfeita neutralidade, demonstrava a entrada ao lado dos Aliados. Mas eles o fazem. E mostram, aí, que não é só de Integralismo que desconhecem.

Na verdade, foi também em fins de 1941 que Plínio Salgado divulgou, a todos os integralistas do Brasil, o Manifesto de 7 de Setembro de 1941. Num momento em que era a Alemanha a grande vencedora da Guerra, Plínio escrevia aos integralistas que “as circunstâncias do mundo vieram criando [perigos] para a liberdade dos povos”. E, num momento em que todos os governos europeus se refugiavam em Londres, no esforço ilimitado de Hitler pelo Lebensraum, escrevia: “As ameaças tornaram-se agora mais pesadas, os perigos mais iminentes, os inimigos, mais próximos, os ardis mais dissimulados e mais imprevisíveis as catástrofes em que soçobram as soberanias políticas e o direito de autodeterminação das nacionalidades”. Falava do liberalismo? Falava do socialismo? Na frase seguinte, começou a falar também dos dois… Estava falando, então, de uma terceira ameaça…

Ele ia além. Enquanto os dois autores acusam Plínio de buscar se apresentar como força oposta a Vargas, no alinhamento da Segunda Guerra (porque, supostamente, achava que, vitorioso o Eixo, ganharia prestígio ele, também), Plínio dizia a todos os integralistas do Brasil, no mesmo manifesto: “Vejo a necessidade da união dos brasileiros, esquecidos de mútuos agravos ou divergências e animados pela deliberação firme de defender nossa Pátria em qualquer circunstância [diante dos perigos da Segunda Guerra Mundial]. Aceita esta preliminar, que é um imperativo do nosso patriotismo, cumpre traduzi-la na sua forma prática de eficiência. Essa forma consiste em darmos o nosso integral apoio ao atual do governo do Brasil, em tudo o que ele houver de se empenhar para defender a intangibilidade da nossa soberania e independência […] colocando-nos, por isso, coletivamente, ao seu dispor, no sentido de lhe prestar quaisquer serviços que os acontecimentos porventura tornem necessários”. E, depois: “Trata-se, no exterior, de nos apresentarmos [o Brasil] numa frente una e indivisível, com o firme propósito de erigirmos em luta de vida e de morte a defesa da nossa soberania, cujo conceito não pode ser alterado ou sofismado”. E, ainda depois: “Quais os atos de caráter político que devem os integralistas praticar? Respondo que nenhum, de própria iniciativa, pois sendo muitas ideias que inspiram o Governo, as mesmas que nos inspiram, e os seus objetivos os mesmos a que aspiramos, será supérflua, de nossa parte, toda e qualquer ação isolada de caráter político. Como se traduzirá, então, a utilidade do vosso apoio? […] [Além de tudo o que foi listado] traduzir-se-á na sinceridade absoluta e no mais luminoso cavalheirismo e realismo com que vos portareis perante o Governo Brasileiro, a quem dais o vosso apoio nesta hora grave do mundo”.

Nos primeiros dias de 1942, a mensagem de Plínio ao Rio pede a “cooperação com o governo do nosso país em tudo o que disser respeito à defesa da Nacionalidade contra todos os terríveis agentes da corrupção interna, e contra quaisquer ameaças externas, venham de onde vierem“.

Nada do que dizia ao público sequer preparava o terreno para a “grande notícia” de que Plínio era o representante dos interesses do Eixo no Brasil, após a “vitória triunfal” da Alemanha, oposto ao “aliadismo” de Vargas. Na verdade, é bem de se imaginar o que aconteceria a Plínio, tendo escrito tudo isso, num cenário em que os Aliados perdessem a guerra…

(E, se os autores quiserem mais uma mãozinha, basta ler a fonte mais primária de todas, suas cartas ao Brasil — como as reunidas em Tempo de exílio, todas insistindo, exatamente, na mesma posição,  desde 1940. E até contra a opinião de outros integralistas!)

O Fascismo em Camisas Verdes, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto: Estorinhas de dois picaretas

Quando um autor já não sabe o que inventar…

Em seguida, os autores dizem que, por não conseguir seu acordo com Hitler, Plínio “buscou o estabelecimento de um discurso seguro e incontestável para a reconstrução do Integralismo: o cristianismo e a utilização da palavra de Deus como justificativa de práticas políticas”.

Que grande novidade esse discurso!

Bem diferente, por exemplo, do seu discurso mais famoso, em 1937, no qual disse: “O Estado Integral, essencialmente, é para mim o Estado que vem de Cristo, inspira-se em Cristo, age por Cristo e vai para Cristo”. É preciso mais que isso? Surgiu, depois do Estado Novo, um discurso mais cristão que esse?

Os autores dizem que Plínio “buscou o estabelecimento” desse discurso a partir de 1942, perdendo o acordo de Vargas e Hitler. Mas esse “discurso” já não existia antes de qualquer possibilidade de acordo com Vargas? Esse “discurso” não era o mesmo que Plínio usava para afirmar o Integralismo contra Hitler?

Temos no portal uma seção inteira com as citações da AIB até 1937 sobre Cristianismo.

Ainda outro deslize básico: segundo os autores, Plínio começou a Vida de Jesus em 1939. Na verdade, ele a começou em 1938 — especificamente, em 25 de dezembro de 1938. Apesar de tão básico, esse deslize desabona mais uma vez a obra dos autores. A Vida de Jesus não é uma obra minoritária de Plínio Salgado: é sua obra máxima, que resume toda a sua vida. As informações sobre sua história foram dissecadas no relato “Como escrevi a Vida de Jesus“, de Plínio. Obscuro? Nem um pouco: está no volume das suas Obras Completas que reúne suas obras mais importantes no exílio de Portugal. Ora, um dos autores escreveu um livro inteiro sobre o exílio de Plínio em Portugal. Não é possível que não tenha acessado este volume (tão fácil de achar)! E não é possível que nenhum dos dois tenha lido sobre a fabricação do livro mais importante da pessoa de que tratam em livros inteiros, pelos quais ganharam renome nacional: mais ainda, um livro em contexto tão importante, escrito durante sua perseguição!…

A tese dos autores, segundo os quais Plínio cristalizou uma “nova doutrinação” cristã, é inacreditável. Seu despreparo só é comparável à sua desonestidade. E a fraqueza de sua pesquisa só é comparável à sua péssima escrita.

Quando os autores dizem que o “fascismo” não era, nos anos 30, um inimigo do Integralismo, demonstram não conhecer o depoimento de Mário F. de Medeiros à Panorama, em 1936: “homens como o Dr. Wolfram Metzler [um dos principais líderes da AIB no Sul] veem no hitlerismo um dos maiores inimigos do movimento integralista, dentro da zona colonial. Tudo acontece bem ao contrário do que espalham as agências telegráficas e os jornais que nos combatem. O Integralismo não encontra nenhum apoio no hitlerismo. Pelo contrário, é combatido por ele”. Não conhecem, também, que um dos chefes mais importantes da Ação Integralista no Rio Grande do Sul, Anor Butler Maciel, em livro de 1937, Nacionalismo, comemorava os “adversários valiosos e inúmeros” da doutrina nazista “no seio da própria colônia teuto-brasileira”. Demonstram não conhecer (ou ignorar) que, em 27 de maio de 1936, Plínio Salgado afirmou que os integralistas combatiam o nazismo em Santa Catarina. E, em 5 de maio, que o nazismo alemão era um perigo para o Brasil.

Se isso não constitui uma inimizade, configura o quê?

Tudo mudou com o PRP!

Os dois autores dizem duas coisas sobre a atuação parlamentar de Plínio Salgado:

1º) Foi de “muita oratória, pouco efetivo”;

2º) A bancada integralista não via prioridade na “implantação de projetos que alterassem o sistema”.

Se tivessem os Perfis Parlamentares de Plínio Salgado, perceberiam sua tolice ainda no primeiro mandato de Plínio. Eles mesmos admitem a participação efetiva de Plínio nos governos de Juscelino e Jânio. Nos eximimos do trabalho maçante de listar toda a sua atividade parlamentar desde 1959, e não falaremos das outras tantas ações efetivas dos integralistas desde a Constituinte de 1946 até os anos 90, já enunciadas em nosso futuro livro As ideias do Sigma.

É verdade que os integralistas dispensavam alterar o sistema? No segundo mandato de Plínio Salgado, se sobressai o Projeto de Revolução Agrária, em 1964. É o maior projeto de reforma agrária já feito no país. Não apenas distribuindo terras, criava uma completa reorganização financeira, econômica e social do Brasil. Os autores o citam en passant. A Câmara Orgânica, um projeto de reestruturação das bases do Legislativo, consta logo do início do segundo mandato. Ambos os projetos alteravam o sistema em seus fundamentos. As propostas perrepistas para o ensino, o serviço militar, a organização municipal (política, econômica, administrativa e financeira), a reforma monetária, a organização bancária, a reforma tributária, a organização do voto, o café etc. modificavam fundamentalmente o sistema.

Os autores contradizem suas duas acusações. Mas as fazem. E as deixam lá.

Outra imoralidade dos autores é referente ao deputado integralista Loureiro Júnior. Segundo os autores, Loureiro Júnior se aproveitou da Lei Cadillac para a importação sem impostos de um Cadillac, “revendendo-o em seguida, o que gerou um enorme lucro”. O problema é que o Cadillac revendido por Loureiro não gerou “lucro” nenhum. Foi todo usado para pagar uma dívida assombrosa de 1 milhão e 450 cruzeiros, assumida na candidatura de Loureiro à prefeitura — dívida que já tinha sido descontada em 2 milhões, levando-o a vender até a própria casa… Sem levar nenhum lucro, Loureiro morreu pobre, pagando mais de seu bolso até o túmulo, quando a dívida seguia astronômica, levando a leilão sua casa, só tendo a viúva, Maria Amélia, sido salva do despejo por doações exorbitantes de integralistas. Para difamar pessoas já mortas, porém, vale tudo…

Algumas informações são tão incríveis que nos deixam curiosos. Os autores, com seu rigoroso preciosismo científico, dizem que o PRP, na ambição insaciável “em busca de postos”, conseguiu um acordo até com João Goulart, levando Raimundo Barbosa Lima à presidência do IPASE. É verdade que um integralista, Luís Compagnoni, foi presidente do IPASE… mas no governo de Juscelino Kubitschek. Em fevereiro de 1961, Jânio Quadros o substituiu por Milton Bolívar de Araújo. E, em abril de 1963, Jango trocou este por Clidenor Freitas. Barbosa Lima, se algum dia pisou na sala da presidência do IPASE, foi para visitar Compagnoni.

Conclusões

Não iremos além, discutindo tudo o que se disse sobre a Frente Integralista Brasileira e sua fundação. Os autores, sem saber ao certo o que escrever, e sem informações precisas, colocaram ali o que quiseram. Arriscando algumas coisas sobre a biografia pessoal dos principais nomes integralistas nas últimas décadas, como os irmãos Carvalho, atestaram, novamente, o fracasso de sua rasa pesquisa. Mostraram, aliás, não conhecer quase nada sobre a atuação recente da FIB. Precisaram ocupar todo o espaço com assuntos irrelevantes, entrando a tratar de loucos (e de movimentos que nem existem)…

O que nos propusemos com este artigo, cremos ter alcançado. O Fascismo em Camisas Verdes, aclamado em todo o Brasil, é um panfleto. Um dos mais fracos. Seus autores não foram capazes de produzir nada de valor acadêmico ou histórico.

É um livro destinado ao esquecimento, como seus péssimos autores.

Matheus Batista
Editor-Chefe das Redes Sociais, Coordenador da Subsecretaria de Propaganda e Suplente de Secretário Geral da Frente Integralista Brasileira

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Matheus Lima

Anauê companheiros, após ler este artigo eu tenho uma questão em mente, se os autores são esse nível de “pessoa”, imagina o público-alvo ! Coitado desta gente que nunca ouviu falar do Integralismo, e quando ouvir falar pela primeira vez, ouvirá através de uma porcaria dessas !

Eduardo Ferraz

Excelente artigo, desmontando ponto a ponto a narrativa militante desses dois “acadêmicos”. Jamais leria tempo e disposição em ler esse livro, portanto agradeço o esforço do autor e da FIB em nos trazer o conteúdo analisado e recheado de fontes primárias.

Marcus Ferreira

O que mais me espantou no livro foi ter sido publicado pela FGV, este sim, um Ditador, e não ter uma nota de rodapé sequer. Se eles quiseram fazer ciência, saiu um romance ficcional.

João Paulo Reis Macêdo Noujaim

Meus parabéns ao companheiro Batista pelas vossas respostas irrefutáveis a esses dois pascácios travestidos de historiadores. Sou Espírita e sei bem que jamais em uma sessão mediúnica feita dentro de um centro espírita essa corja ia conseguir algum tipo de resposta proveniente do chefe, até mesmo porque sequer eles que não acreditam em Deus pelo que parece em vossas publicações, iam receber mensagens de espíritos de luz, muito menos do Chefe nacional da ação integralista brasileira, Plínio Salgado, portanto teriam que provar até mesmo para cientistas que estudam psicografias como o ilustre Guilherme velho autenticidade dos fatos, coisa que não… Read more »

RONALDO PONCIANO DE ASSIS

Saudações INTEGRALISTAS ( Leia-se DUPLO ANAUÊ ! ) !! Serei claro, preciso, conciso e cristalino com o seguinte questionamento: TODOS E QUAISQUER PARTIDOS POLÍTICOS, MOVIMENTOS E DOUTRINAS SÃO BASEADOS, PRIORITARIAMENTE, EM SEUS DOCUMENTOS DE FUNDAÇÃO E NORTEAMENTO IDEOLÓGICO, FILOSÓFICO, BEM COMO, PROGRAMAS, ESTATUTOS E TESES, OS CHAMADOS DOCUMENTOS OFIFICIAS ! Estudando O INTEGRALISMO em seus Documentos Básicos Oficias como: Manifesto de 7 de outubro de 1932; Manifesto da Guanabara, Códigos de Éticas dos Estudantes e Jornalistaas; tais quais as literaturas de PLÍNIO SALGADO, GUSTAVO BARROSO e ALBERTO TORRES, não encontramos nenhum respaldo ou vinculação com as nefastas ideologias e doutrinas… Read more »

Última edição 4 anos atrás por RONALDO PONCIANO DE ASSIS
João Augusto V. da Silva

Que belo texto, desmontando a farsa deste livro horrendo.

Fabio Ygor Nogueira Venceslau

Existe algum livre com registros antigos de filiação? Alguém sabe me informar? Acredito que meu avô era.

Fabio Ygor Nogueira Venceslau

Olá. Ele era conhecido como Adelino Nogueira. Na identidade, o nome está Adelino Nogueira de Souza porém na certidão de nascimento da minha mãe, o nome dele aparece como Adelino Nogueira Silva.
A pouca informação que eu tenho é de que ele morava em Jaguaribe, na juventude.

Pesquisando na internet, encontrei um Adelino Nogueira neste site: http://www.snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1364955604_ARQUIVO_Artigo_Joao_Rameres_Regis.pdf

Será que era ele? Se houver registros, com o nome do pai e mãe, por exemplo, a duvida diminuiria.

Obrigado pelo retorno.

Fabio Ygor Nogueira Venceslau

Opa, Matheus.
Mesmo assim, muito obrigado pela iniciativa. Agradeço muito.
Fique com Deus.

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