É possível substituir a democracia liberal pela democracia orgânica corporativa, partindo da Constituição Federal “Cidadã” de 1988 e de maneira democrática?
Podemos afirmar que sim.
Como estabelece o § 4 do art. 60 da CF88, são cláusulas pétreas constitucionais:
“I – a forma federativa de Estado;
II – o voto direto, secreto, universal e periódico;
III – a separação dos Poderes;
IV – os direitos e garantias individuais”.
Nós, integralistas, já deixamos bem clara nossa preferência pelo regime federativo da Nação. É máxima conhecida do Integralismo: “centralização política e descentralização administrativa”. Com efeito, diz Alberto Cotrim Neto a esse respeito que “centralizar a administração do país com uma política irrestritamente unitarista seria o passo mais avançado para a decomposição do nosso bloco nacional” [1].
O voto direto, secreto e periódico é uma realidade em qualquer regime democrático — e é esse o objetivo do Integralismo, realizar uma verdadeira democracia. No entanto, há o inconveniente, na CF88, do voto universal. Como conciliar o sufrágio universal a um regime corporativo? Não nos atemorizemos de prestar libelos à sua instituição — de fato, seria muito mais agradável, como diz Oliveira Vianna, [2] que o voto fosse concedido apenas ao cidadão sindicalizado, imerso em pequenas democracias, porque este regime é mais adequado à realidade democrática, sociológica e histórica brasileira. Assim, segundo Gustavo Barroso, um sindicato por classe em cada município gozaria de direitos políticos. No entanto, sendo muito mais benéfico o estabelecimento da representação corporativa do que a representação liberal de qualquer maneira, é compreensível que, com adequação constitucional, seja plenamente possível realizar um “corporativismo de sufrágio universal”, em que cada trabalhador, identificado em sua Corporação, vote por ela, e não pelo sindicato. Da mesma maneira como o voto individual no sufrágio universal é circunscrito geograficamente pelo Município e pelo Estado, pode-se circunscrevê-lo pela Corporação.
A instituição de Corporações, ao menos segundo as cláusulas pétreas estabelecidas no § 4 do art. 60, não encontra qualquer empecilho, podendo ser defendida até mesmo em programas partidários, porque é item de emenda e não substituto à ordem constitucional. Mesmo a criação de Câmaras Corporativas em lugar das Câmaras políticas liberais não é obstruída de maneira pétrea pela Constituição, ainda que seja muito mais viável politicamente fazer, como o fez Plínio Salgado, somente a proposição de uma Câmara anexa (a Câmara Orgânica). Embora seja ideal que as Corporações venham a substituir os partidos na ordem democrática, o próprio Mihail Manoilesco, mais eminentes dos teóricos do Corporativismo, admitia a existência de partidos numa ordem corporativa. [3]
Enfim, resta que o Integralismo é e sempre será o único defensor das garantias e dos direitos individuais, por defendê-los em sua qualidade de Pessoa e em suas expressões no Tempo e no Espaço (grupos naturais), e jamais se posicionará contra a separação dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, de maneira que sua forma de “democratização das fontes de poder jurisferante e legisferante”, para nos assemelhar à pena de Cotrim Neto, [4] são as convenções coletivas do trabalho, já há muito previstas na Lei, ainda que de maneira inadequada.
De tudo isso, conclui-se que o Integralismo, através do seu conceito de Democracia Orgânica, está plenamente de acordo com a ordem constitucional vigente no Brasil e nela pode atuar, inclusive por meio de partidos, dentro dos quais jura fidelidade à Constituição.
Matheus Batista
Secretário de Ação e Mobilização da Diretoria Administrativa Nacional
Notas e referências:
[1] Alberto Cotrim Neto — “Doutrina e Formação do Corporativismo”, p. 226.
[2] “Instituições Políticas Brasileiras”, edição da Livraria do Senado, p. 481 et seq.
[3] Recordamos a insubstitutibilidade das Corporações: elas são os órgãos de regulação da indústria ou ciclo de produção respectivo, sendo a única maneira de realizar uma correta administração da sociedade econômica e uma verdadeira justiça social. Vide nosso artigo, “Por que as Corporações?“.
[4] V. “Dos Contratos Coletivos do Trabalho”.