À margem das Reflexões sobre a Violência de Sorel, escrevi a lápis (porque a tinta indelével poderia durar mais do que o livro…) esta pergunta: “como foi possível aos cristãos vencer em Roma, sem este mestre revolucionário?”

Deve existir outra técnica… Estou convencido de que existe uma arte de conquistar povos livres, avessos aos arbítrios de todas as tiranias.

Esse método ressalta nas páginas dos Evangelhos. Atravessou vinte séculos de vitória.

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A Legião Tebana, dizimada nas Gálias, por Maximiano, nega-se a incensar os deuses pagãos. Ela é a mais valente na guerra contra os inimigos do Império, porém é inabalável na sua crença.

Maximiano manda contar até dez. O soldado sai da fileira e é abatido. Conta-se novamente até dez: o décimo tomba. A Legião persiste. Já caiu mais de metade. Afinal, o César impressiona-se. A firmeza é tão grande que Maximiano toma os tebanos para sua guarda pessoal.

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No Coliseu, rugem os leões. Quem vai enfrentá-los? Crianças, velhinhos; mães com os filhos ao regaço, donzelas inermes. A multidão comove-se. Multiplica-se o número de cristãos.

A “ideia nova” penetra no Fórum, nas Termas, no Palatino, fermenta na Suburra, infiltra-se no Exército Imperial, brilha nas conversações dos triclínios, fulgura ao fundo das galeras que batem seus remos no Mare Nostrum.

A violência dos perseguidores galvaniza o pensamento, que adquire crescente magnetismo e arrasta as turbas. Desde o início, a brutalidade dos tiranos impulsionou a Grande Revolução. As perseguições romanas vitalizaram-na. São inúteis todas as violências e todos os crimes.

No fundo das catacumbas germina a primavera do mundo.

Podem declará-la fora da lei. Podem baixar éditos para abatê-la. Não há velário que esconda a madrugada. O sol há sempre de sorrir sobre as nuvens passageiras. Quem subordinará as estrelas, a pujança do mar e o ímpeto das selvas, aos artigos e parágrafos dos decretos humanos?

Ninguém poderá deter a marcha do Espírito e a Renovação da Terra.

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Durante a batalha ferida entre os comunistas e integralistas na Praça da Sé, em S. Paulo, aqueles gritavam: “Morra Deus!” No Alto, sorria um grande céu azul. Em baixo os integralistas derramavam seu sangue por uma ideia. Mulheres e crianças resistiam cantando ao fogo das metralhas. Não! Deus não morre no coração dos homens!

Os que submetem a luta social aos princípios do evolucionismo darwiniano esquecem-se de examinar a “outra face do mundo”. Perderam-se no estudo unilateral das leis da matéria e abandonaram as leis do espírito.

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O terror nunca venceu. Basta examinar a História. O terror dos cossacos do Czar gerou o comunismo; o terror vermelho do comunismo gera o Integralismo. O Integralismo vai ser a lei da bondade, a lei da harmonia social, a lei da solidariedade humana, do respeito à personalidade, da distribuição equitativa da liberdade, a fim de que não se torne o monopólio dos criminosos, dos maus, e sim o direito e o dever de todos os bons.

Enganam-se os que acreditam que os povos possuidores de uma profunda consciência de liberdade se amedrontam com ameaças de tiranias. O comunismo para estar de acordo com Marx teria de vencer primeiro na Alemanha e na Inglaterra. Jamais supôs Marx que ele vencesse na Rússia. A vitória da violência na Rússia foi preparada pelo hábito de escravidão das massas desde Catarina a Pedro I. Acostumadas ao domínio do chicote, as pobres massas russas continuam a sofrer o mesmo velho sofrimento das velhas escravidões. A mão agora é outra, mas o rebenque é o mesmo. Com mais violência.

Vi estampada numa revista de propaganda da URSS a fotografia de um “posto de ordenhação” dos Sovietes. Uma fila de mulheres, deixando-se ordenhar, como vacas, porque na Rússia é proibido às mães amamentarem seus filhinhos. Essa cena degradante, que apresentam como reclame do regime, demonstra a escravidão de um povo. No Brasil, jamais as mães tolerariam isso.

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Eis por que nasceu uma ideia nova em nossa Pátria. Para salvar o Brasil da humilhação a que o pretendem submeter estrangeiros que organizam complôs terroristas, mancomunados com literatos pequenos-burgueses e ante a indiferença criminosa de uma burguesia podre e o beneplácito de um capitalismo indecente.

Essa ideia nova, que é o Integralismo, está penetrando as classes proletárias, tão sofredoras; está penetrando, como um memento, nas casas dos ricos materialistas e roubando-lhes os filhos moços, mais capazes do que eles, de compreender o drama da Pátria; está se infiltrando triunfalmente em toda a parte. Nada mais a deterá.

Nos bairros sofredores dos proletários; nas casas modestas da classe média; nas pensões de estudantes; nas casernas dos sorteados, nas oficinas, nos campos e no sertão; nas cidades pequeninas, na selva onde geme o caboclo junto à gleba, e no oceano, no bojo dos navios, em toda a parte, se sente hoje a ânsia, que se traduz nestas palavras: “Nós implantaremos o Estado Integralista”.

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Quando uma ideia deixou de pertencer a um homem para pertencer a uma massa, tudo o que se fizer para abafá-la será utilíssimo para o seu revigoramento.

Para um povo como o brasileiro, que ama a sua liberdade até ao delírio, a técnica não pode ser a de Sorel, mas a de Cristo.

Praticamente desarmadas, nossas coortes, cujo efetivo aumenta a cada violência que contra elas praticam, têm a missão de sustentar, como a Legião Tebana, os princípios imortais da nossa bandeira.

Nossa vitória não virá em consequência de “golpes técnicos” nem como resultado de conspiratas contra os governos constituídos; virá, automaticamente, pela infiltração poderosa das ideias.

Não estou chefiando este movimento por ambição pessoal. À proporção que ele cresce vou-me sentindo desobrigado perante a História.

Quero ser a raiz obscura enterrada no coração da Pátria.

A Grande Árvore já está de pé. A seiva que a alimenta não sobe através de mim apenas. Eu já me multipliquei em numerosas raízes. Que raízes são essas? A mocidade da Pátria.

A Grande Árvore cresceu. Rebenta já em flores da Primavera.

A certeza dos frutos é muito mais importante do que os próprios frutos. Uma juventude invencível cresceu em torno de mim. A ela pertencerá o Brasil. Quando? Não me interessa. A ela é que interessa. E os moços não permitirão que nenhum aventureiro se apodere da sua ideia para desvirtuá-la. Sua resistência será a resistência da Grande Árvore aos embates das tempestades.

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O desenvolvimento do Integralismo, até seu triunfo, terá de obedecer a leis próprias, inerentes à psicologia social de determinada massa humana, em determinadas circunstâncias geográficas, históricas, econômicas e, principalmente, espirituais.

A um povo livre, generoso e heroico não se deve tentar aterrorizar, e sim comover.

Os métodos de violência não impressionam brasileiros. Que o soviete mude de tática porque não está tratando com escravos. E que os liberais-democratas atentem para os excessos de liberdade que outorgam aos magnatas, aos ricaços, aos comunistas, aos ateus, porque o povo brasileiro quer salvar a verdadeira liberdade das ameaças do nefando liberalismo. E, para isso, a Pátria já despertou!

Plínio Salgado
Publicado originalmente em “A Offensiva”, 8 de novembro de 1934. Republicado em “Palavra Nova dos Tempos Novos”, 1936.