A ideia de estudar o desenvolvimento econômico, à luz da doutrina integralista, me foi sugerida, há um ano, por Gumercindo Rocha Dorea. Não há dúvida de que a sugestão estava além de nossa capacidade; entretanto, iniciamos a coleta de material, livros e publicações do Conselho de Desenvolvimento, do próprio ISEB, do Banco do Nordeste e outros organismos.
Do exame de todo o material coletado nasceu o artigo de hoje, uma elementar introdução, diríamos mesmo, um índice a um programa de desenvolvimento integralista.
Vale assinalar que os grandes centros de estudos econômicos aplicados inclinam-se, indiscutivelmente, para uma programação global, podemos dizer, integral, do desenvolvimento.
A sugestão foi aceita e continuaremos a meditar e pesquisar o tema que é o germe de um programa de governo inspirado nos princípios integralistas e que objetive arrancar o Brasil de seu atraso econômico, tanto no setor industrial como no agrícola.
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Conceituando o desenvolvimento econômico, de conformidade com Ewaldo Corrêa Lima, [1] isto é, “o crescimento firme e contínuo da renda real per capita de uma comunidade, quer dizer o aumento, dividido pelo crescimento demográfico, da produção líquida de bens e serviços disponíveis para consumo ou para formação de capital, o que implica em mudanças materiais e sociais”.
Juntamos a esta ideia a opinião de Celso Furtado [2] de que a configuração de subdesenvolvimento face ao desenvolvimento é que esse se efetiva com a vinda de novos conhecimentos científicos e o subdesenvolvimento é, sobretudo, um processo de assimilação da técnica prevalecente na época.
O nosso problema é, pois, o de assimilar e nos pormos em dia com as técnicas e processos já existentes em países plenamente desenvolvidos.
Para atingir aos objetivos de desenvolvimento, teremos que atentar para um planejamento de longo prazo servido de planos específicos para áreas geoeconômicas e setores econômicos.
O esforço para obter o desenvolvimento, implica numa concentração de recursos naturais, mão-de-obra, capitais e técnica. Os nossos recursos, em tais setores, não são mobilizáveis a curto prazo e, mesmo, inexistem.
Os estudos das economias pouco desenvolvidas, levados a efeito pela Comissão Econômica para a América Latina, demonstraram a existência de peculiaridades comuns às áreas subdesenvolvidas.
Uma das conclusões mais interessantes a que chegou a dita Comissão é a respeito dos estrangulamentos existentes nas zonas observadas.
A economia de tais zonas tende, mesmo que vegetativamente, a se desenvolver, mas é detida por alguns pontos chamados de estrangulamento, ou gargalos de garrafa.
Melhor explicando, diríamos, como o economista Louis Baudin, que a expansão da produção é análoga à marcha de um comboio marítimo: a velocidade do conjunto é comandada pela velocidade do navio mais lento. Sim, em um comboio, a velocidade máxima não pode ir além da do navio mais vagaroso que equivale, na comparação, aos chamados pontos de estrangulamento, na economia.
A ideia do comboio de Baudin evidencia, mais uma vez, a afirmação de Plínio Salgado, a propósito da necessidade de uma solução em conjunto. A produção sem transporte, ou transporte sem produção, são primarismos que, infelizmente, ainda sucedem no quadro da nossa economia.
No caso brasileiro, os pontos de estrangulamento mais conhecidos são, inegavelmente, a energia, o transporte e as indústrias de base. Por outro lado, sofremos estrangulamentos setoriais, como a falta de mão-de-obra especializada, falta de crédito, etc.
Numa concepção integralista do desenvolvimento, teremos que atentar para os seguintes postulados:
1. Visão integral do processo econômico, considerando, globalmente, os vários problemas e relacionando-os devidamente.
2. Análise especial das interrelações dos fatores natureza (terra e matérias-primas), trabalho (intelectual e físico), capital (moeda e crédito) e técnica.
3. Localização dos pontos de estrangulamento regionais, setoriais e de conjuntura.
4. Levantamento e plano de aplicação de recursos existentes, segundo um critério de prioridades.
5. Concepção dinâmica do processo de desenvolvimento, atentando para as interrelações do mercado interno e o equilíbrio da balança de pagamentos.
6. Plano de industrialização, de forma a evitar a pressão sobre a base agrária e a inflação.
7. Equilíbrio entre os vários componentes do processo econômico e controle sobre a taxa de instabilidade, comum às economias em desenvolvimento, atentando, especialmente, para os equilíbrios entre:
a) oferta e procura, para o equilíbrio dos preços;
b) meios de pagamento e bens produzidos, para garantir o valor da moeda;
c) produção e consumo, para garantir o pleno emprego e evitar o subconsumo;
d) industrialização e a base agrária, para evitar o êxodo e garantir o equilíbrio do processo de desenvolvimento;
e) exportação e importação, para garantir a estabilidade da balança de pagamentos.
8. Adoção de um planejamento que considere os seguintes elementos:
a) estimativa dos recursos naturais, humanos e de capital disponível;
b) esquema de aplicação, levando em conta o critério de prioridade, fundado na teoria dos estrangulamentos;
c) estimativa dos impactos e ajustes dos desequilíbrios gerados pelo desenvolvimento;
d) controle permanente dos planejamentos setoriais e regionais, à base de conselhos especiais dos setores e das regiões envolvidas no plano;
e) revisão da estrutura dos órgãos públicos, divisão mais científica das funções ministeriais e autárquicas.
Finalmente, devemos criar um novo arcabouço jurídico, que contribua e não impeça o desenvolvimento; conforme lembra o economista Ignácio Rangel, [3] o direito não deve ser um empecilho, especialmente aos povos novos como o nosso, cuja força criadora tende a estabelecer novos e revolucionários padrões de existência.
Aníbal Teixeira
A Marcha, 13 de novembro de 1958.
Referências
[1] Ewaldo Corrêa Lima — “Política do Desenvolvimento” em Introdução aos Problemas do Brasil — ISEB — 1956.
[2] Celso Furtado — A Economia Brasileira: contribuição à analise do desenvolvimento — Editora A Noite — 1954.
[3] Ignácio Rangel — Introdução ao Estudo do Desenvolvimento Econômico Brasileiro — Livraria Progresso Editora — 1957.