Faleceu, na cidade de Brasília, no último dia 19 de abril, aos oitenta e dois anos de idade, o Dr. Ronaldo Rebello de Britto Poletti. Mais conhecido apenas como Ronaldo Poletti, foi ele um brilhante advogado, professor universitário, jurista, escritor, romanista, historiador e filósofo do Direito. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), a velha e sempre nova Academia do Largo de São Francisco de tantas tradições, e mestre e doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), lecionou por vários anos nesta última instituição, onde deu aulas de Direito Romano, Introdução ao Estudo do Direito e Filosofia do Direito e também dirigiu o Centro de Estudos de Direito Romano e Sistemas Jurídicos e a Notícia do Direito, órgão oficial da mesma Faculdade de Direito. Era presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal (IHGDF) e da União dos Romanistas Brasileiros (URBS) e professor emérito da Escola da Magistratura Federal da Primeira Região e foi, dentre outras coisas, presidente do Instituto dos Advogados do Distrito Federal (IADF), Procurador de Justiça do Estado de São Paulo, Consultor-geral da República e Consultor Jurídico dos Ministérios da Justiça e da Aeronáutica. Na juventude, militou no Partido de Representação Popular, presidido por Plínio Salgado, e no chamado Movimento Águia Branca, participando ativamente das atividades do Grêmio Cultural Jackson de Figueiredo e da Confederação de Centros Culturais da Juventude, que tinha Plínio Salgado como Presidente de Honra, e fundando, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o Partido de Representação Acadêmica. Colaborou em diferentes periódicos, incluindo a importante revista de cultura Convivium, de São Paulo, e publicou diversos trabalhos, dentre os quais podemos destacar os livros Controle da constitucionalidade das leis (1985), Da Constituição à Constituinte (1986), Introdução ao Direito (1991), Elementos de Direito Romano Público e Privado (1996), A Constituição de 1934 (1999), Conceito jurídico de Império (2009) e Constituição anotada (2009) e artigos como “Século XX, século de síntese” (1965), “A revolução do desenvolvimento” (1969), “A ordenação social do Estado” (1978), “O pensamento político de Miguel Reale” (1981), “A ideia brasileira de Império” (1992), “O Direito em Plínio Salgado” (1996), “A propósito da dialética em Miguel Reale” (2000), “Miguel Reale, uma vida gloriosa” (2006) e “O Direito em Santo Agostinho” (2016), assim como o excelente prefácio à obra Horizontes da História e do Direito: Estudos em memória do Professor Miguel Reale (2022), de Acacio Vaz de Lima Filho. Deixou inédito um livro sobre a vida e a obra do jurista Alfredo Buzaid, de quem foi secretário e amigo. [1]

Nascido em Bauru, no interior de São Paulo, em 31 de março de 1942, Ronaldo Poletti era filho de Ribelle Poletti, paulista de origem italiana, e de Zaida Pinto de Britto, natural de Alagoas, e ainda na infância mudou-se para a Capital Paulista, onde fez o curso primário no agora extinto Colégio Stafford, o curso ginasial no tradicional Colégio São Bento e o curso clássico no Colégio Rio Branco. Mais tarde, cursou a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, onde foi aluno de Miguel Reale, Alfredo Buzaid e Goffredo Telles Junior, autores que muito marcaram a sua formação jurídica e tinham pertencido à Ação Integralista Brasileira (AIB) e se conservavam fiéis aos princípios essencialmente cristãos e brasileiros do Integralismo, aos quais, aliás, o então acadêmico Poletti aderiu depois de estudar profundamente a obra de Plínio Salgado, tornando-se inclusive um dos mais ilustres vultos da chamada Segunda Geração Integralista. Nesse período, publicou diversos trabalhos sobre temas que iam da Filosofia do Direito à Literatura e, como restou dito, militou ativamente no Partido de Representação Popular (PRP) e no Movimento Águia Branca, participando das atividades do Grêmio Cultural Jackson de Figueiredo e da Confederação de Centros Culturais da Juventude (CCCJ) e fundando, na faculdade de que era aluno, o Partido de Representação Acadêmica, orientado pelos mesmos princípios do Partido de Representação Popular, bem sintetizados no lema “Deus, Pátria e Família”.

Alfredo Buzaid

Tendo se formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da USP em 1966 e advogado em São Paulo por alguns anos, foi Poletti nomeado promotor público em 1969, com apenas vinte e sete anos de idade, atuando como membro do Ministério Público do Estado de São Paulo nos municípios de Penápolis e Bilac, bem como na Capital Paulista. No início da década de 1970, a convite de Alfredo Buzaid, então Ministro da Justiça, mudou-se para Brasília, onde atuou inicialmente no Ministério da Justiça, de que foi consultor entre os anos de 1972 e 1979, e mais tarde foi, dentre outras coisas, consultor jurídico do Ministério da Aeronáutica, diretor-geral de Secretaria do Supremo Tribunal Federal (STF), consultor-geral da República, presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal (IHGDF) e da União dos Romanistas Brasileiros (URBS) e professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, pela qual se tornou mestre em 1991, com a dissertação intitulada A vertente romanista da dicotomia Direito Público/Privado, e doutor em 2007, com a tese Elementos para um conceito jurídico de Império. Um dos mais notáveis jusfilósofos, historiadores do Direito e romanistas brasileiros, desviou-se Poletti da maioria dos nossos romanistas pela importância que deu ao Direito do povo do Lácio, como, aliás, bem assinalou o Prof. Acacio Vaz de Lima Filho, que igualmente tem plena consciência de que, diversamente do que supõem alguns, não foram os romanos gigantes apenas no campo do Direito Privado, como também no âmbito do Direito Público.

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À frente do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal (IHGDF), revelou-se o Prof. Poletti um exemplar gestor, que conduziu aquela prestigiosa instituição a uma verdadeira Idade de Ouro. Dentre as personalidades que a seu convite ingressaram em tal Instituto durante sua profícua gestão, destacamos o Prof. Paulo Fernando Costa, ex-deputado federal e membro fundador e conselheiro da Frente Integralista Brasileira (FIB), que no IHGDF ocupa a cadeira cujo patrono é Plínio Salgado.

Tem toda a razão o Ministro Gilmar Mendes, colega de magistério do Prof. Ronaldo Poletti por diversos anos na UnB, ao afirmar, em postagem em sua conta no X, antigo Twitter, que o Prof. Poletti, além de “romanista dos mais ilustres”, foi um “mestre de várias gerações de juristas” e um “exemplo de seriedade e compromisso acadêmico”, do mesmo modo que está inteiramente certo o Dr. Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, ex-Consultor-geral da União, ao dizer que “Poletti foi um polímata, um homem de conhecimento múltiplo e profundo”, assim como um humanista. E de fato foi o Prof. Poletti não apenas um brilhante jurisconsulto e um polímata, como também um autêntico humanista, tanto por ter sido um estudioso das humanidades, quanto por haver sido um defensor do humanismo, porém, é claro, não de um humanismo qualquer, e sim de um humanismo teocêntrico e verdadeiramente integral, que concebe o homem como criatura de Deus dotada de corpo e alma e de aspirações materiais, intelectuais e morais.

Rogamos a Deus Todo Poderoso que receba o Prof. Poletti na Pátria Celeste e que conforte o coração de seus familiares, assim como pedimos ao Altíssimo, Criador e Regente do Universo, que suscite em nossa Pátria, nas gerações do porvir, juristas e homens com as mesmas virtudes do Prof. Poletti.

Victor Emanuel Vilela Barbuy 
São Paulo Σ SP

[1] A propósito, bem nos lembramos da reunião que tivemos há alguns anos com o Prof. Poletti no apartamento que ele então possuía no bairro de Higienópolis, em São Paulo, em que igualmente estavam presentes, dentre outros, o Prof. Acacio Vaz de Lima Filho e o Dr. Gumercindo Rocha Dorea e na qual o Prof. Poletti propôs que fizéssemos uma coleção de livros sobre juristas notáveis que pertenceram ao Movimento Integralista, coleção de que seu livro sobre Buzaid seria o primeiro volume e que infelizmente acabou não sendo feita. Cumpre notar que foi essa a primeira das reuniões que tivemos com o Prof. Poletti, com quem voltamos a nos encontrar em São Paulo e depois em Campos do Jordão, na casa que ele tinha naquela aprazível estância climática da Serra da Mantiqueira.

[2] “Um adeus ao Poletti” (texto inédito a ser publicado no próximo número do boletim A Folha Dobrada, da Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito da USP).

[3] “Adeus a Ronaldo Poletti: jurista e humanista”. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-abr-21/embargos-culturais-adeus-a-ronaldo-poletti-jurista-e-humanista/. Acesso em 29 de abril de 2024.

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